terça-feira, 2 de novembro de 2010

Tristeza hormonal


Depressão pós-parto pode ser confundida com problema na tireoide

Chris Bertelli, iG São Paulo


“Nem toda tristeza no período pós-parto é depressão.” A avaliação do endocrinologista Pedro Saddi, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), é um alívio para muitas mães. Sonolência, fraqueza e tristeza também podem ser sintomas de hipotireoidismo, o funcionamento insuficiente da tiroide, uma glândula de apenas 20 gramas, que tem o formato de uma borboleta e está localizada no pescoço. A tireoide é a responsável pelo bom funcionamento de praticamente todo o corpo. Ela produz dois hormônios importantes – o T3 e o T4 –, que controlam dos batimentos cardíacos ao metabolismo, passando pela atividade cerebral.

O hipotireoidismo é uma doença comum em mulheres, principalmente aquelas que acabaram de dar à luz. O corpo dá sinal de que algo não está bem nas seis primeiras semanas após o nascimento do bebê. Segundo um estudo realizado pelo Departamento de Endocrinologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), 13% das paulistas sofrem de tireoidite pós-parto.


Ainda não se sabe exatamente porque essa disfunção aparece no pós-parto, mas os médicos acreditam que a doença seria o resultado de uma falha na reorganização do organismo feminino. “Durante a gravidez, o corpo e os hormônios da mulher se alteram. A imunidade – a defesa do organismo – sofre modificações e o corpo fica mais tolerante. Ao término da gestação, ela deixa essa tolerância e vai para um estágio de intolerância, rejeitando estímulos do próprio corpo. A tireoide passa a ser reconhecida como um corpo estranho e é atacada”, explica o endocrinologista.

Tratamento simples, sem prejudicar a amamentação

Muitos casos de tireoidite pós-parto são passageiros, mas não devem deixar de inspirar cuidados. Se o exame que mede o TSH, hormônio da tireoide, confirmar a doença, a mãe deverá tomar remédio todos os dias para regular o funcionamento da glândula. O hormônio ingerido pela mãe pode passar parcialmente para o bebê por meio do leite, mas a tiróide dele regulará as funções do corpo sem trazer maiores consequências.

Disfunções

As disfunções da tireoide são mais comuns em mulheres “por conta da ação direta do estrogênio, o hormônio feminino, sobre a glândula”, explica Hans Graf, presidente da Sociedade Latino-Americana de Tireoide e membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM). O hipotireoidismo e o hipertireoidismo, respectivamente o funcionamento insuficiente e o exagerado da tireoide, são as mais freqüentes. Segundo estimativas da entidade, 10% das mulheres acima dos 40 anos e 20% das mulheres acima de 60 anos têm algum desses problemas.

Tireoide preguiçosa

Nem sempre os sinais de que a tireoide anda produzindo menos hormônio do que deveria são facilmente perceptíveis. Os principais sintomas da doença como fraqueza, depressão, dores musculares, alteração de humor e ganho de peso podem passar despercebidos ou ainda serem facilmente confundidos com estresse. “Eu nunca senti nada de diferente, só descobri que tinha isso durante um check-up pedido pelo médico”, conta a aposentada baiana Darci Souza de Albuquerque, de 65 anos, que há cinco toma remédios para manter o bom funcionamento da glândula.

O hipotireoidismo pode ser congênito ou causado por doenças autoimunes, como a doença de Hashimoto, na qual o corpo passa a produzir anticorpos contra a própria tireóide. Em recém-nascidos, o problema é identificado pelo “teste do pezinho”. Em adultos, os médicos recomendam exames de sangue para medir a dosagem do TSH (hormônio que regula a tireóide). A partir dos 35 anos, eles devem ser feitos anualmente.

Glândula a todo vapor

Mas, e quando a tireoide funciona muito além do esperado? Nesse caso, os sintomas são claros, já que todos os processos metabólicos estão acelerados. “A pessoa perde peso muito rapidamente, tem taquicardia, insônia, tremor nas extremidades”, relata o Dr Hans Graf. O hipertireoidismo é mais comum em mulheres mais jovens, em torno dos 20 anos, mas apenas 2% da população feminina apresentam a disfunção.

O problema também é ocasionado por uma doença autoimune, a doença de Graves. Apesar de o diagnóstico ser mais fácil, o tratamento, neste caso, é mais complicado. Existem três formas de controlar o hipertireoidismo: com medicamentos que diminuam a produção de T4, com a administração de iodo radioativo e com a extração total da tireoide – em casos mais graves.

A culpa é da genética?

As duas disfunções mais comuns estão relacionadas com uma combinação de predisposição genética e fator ambiental. “O estresse, por exemplo, faz com que a produção de cortizol, um hormônio imunoregulador, aumente, desencadeando a doença”, relata Dr. Graf. “Há um aumento nos casos de hipotireoidismo, por exemplo. Isso pode estar relacionado com o estresse ou também com o aumento do consumo de sal pela população. O brasileiro ingere de 6g a 10g de sal diariamente, quando o recomendado pela Organização Mundial de Saúde é de 4g a 6g”, alerta o médico.

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