Ronco é indício de problemas cardíacos e diabetes
Fernanda Aranda, iG São Paulo
O barulho não parece um som feminino, mas ronco também é problema de mulher. O sinal noturno, inclusive, não deveria ser motivo para vergonha e sim para cautela.
As pesquisas mais recentes atestaram que o ruído é um forte indício de risco de infarto, acidente vascular cerebral (AVC) e diabetes, as três doenças que mais ameaçam a vida das brasileiras.
Após os 40 anos de idade, afirmam os especialistas, elas perdem a proteção hormonal e aparecem equiparadas aos homens nas estatísticas de uma doença chamada apneia do sono, que tem como um dos sintomas clássicos o ronco.
Geraldo Lorenzi, pneumologista da Universidade de São Paulo (USP) e especialista em medicina do sono, explica que apneia é um problema “traiçoeiro”, caracterizado pela ausência repetida de respiração por alguns segundos enquanto a pessoa está dormindo.
“Homens e mulheres sofrem deste mal e o ronco, nestes casos, é alto, contínuo e parece que ressuscita a pessoa. É comum acordarem com o próprio barulho, como se estivessem afogadas”, diz. “Nem todo mundo que ronca tem apneia, mas todos que têm apneia roncam.”
Antes a apneia era considerada grave porque compromete a qualidade de vida, impede o descanso durante o sono, atrapalha a concentração, o humor e até os relacionamentos. Agora, a preocupação dos estudiosos é dupla: os estudos têm mostrado que a probabilidade de sofrer problemas cardíacos, vasculares e também metabólicos é duas vezes maior em quem tem apneia, como explica o cardiologista do Instituto do Coração (Incor) e pesquisador da qualidade do sono, Rodrigo Pedrosa.
“Como a pessoa fica sem respirar por alguns instantes diminui a oxigenação do organismo. Isso faz com a pressão arterial fique mais alta, aumentando os riscos de enfarte e AVC”, explica. “Outro problema é que, sem oxigênio, a produção de adrenalina também é super estimulada, o que aumenta a produção de glicose e, por consequência, o diabetes.”
Pedrosa afirma que diversos estudos norte-americanos já confirmaram a relação entre apneia e complicações cardíacas. Um deles, feito por meio da análise de 1.000 atestados de óbitos, concluiu que o risco de morte cardiovascular era duplicado nos que sofriam agravos do sono. “Confirmamos o risco em um estudo feito no Incor. Analisamos 80 pacientes, metade com apneia, outra sem. Identificamos arritmia (batimentos irregulares do coração) em 30% dos pacientes com apneia e apenas em 6,25% nos que não tinham a queixa.”
Mulheres desavisadas
Uma pesquisa feita o ano passado pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) mostrou que a apneia é muito mais presente nas “camas” da população do que se imagina. Em análise feita com 6 mil adultos foi atestado que 32% deles tinham algum grau de ausência de respiração no sono. Para entrar no grupo era preciso ter mais de 15 “paradas” de respiração por minuto dormindo. Em casos graves, são mais de 30 paradas.
A responsável pelo Instituto de Medicina do Sono, Lia Bittencourt, explica que os sinais do problema são sonolência constante, hipertensão e cansaço, quase sempre negligenciados pelos pacientes e pelos médicos.
Rosana Alves, especialista em sono da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, lembra que entre as mulheres a identificação do problema é ainda mais difícil. “Primeiro porque no sexo feminino, em vez de sonolência, um dos sintomas comuns de apneia é depressão, o que dificulta ainda mais o diagnóstico. Depois porque as mulheres escutam o ronco dos maridos e avisam que eles estão com problema. O inverso nem sempre acontece e a queixa passa sem ser percebida.”
Obesidade e tratamento
A apneia do sono acontece quando há muita gordura na faringe, dificultando a passagem do ar, o que provoca as paradas respiratórias. Por isso, as pessoas obesas estão no topo do ranking do grupo de risco. Idosos, que ficam com a musculatura do pescoço mais frágil, também são mais vulneráveis. Má formação craniana é outro motivo, sendo mais comum em crianças (1% dos menores de 18 anos tem apneia).
O tratamento convencional é feito com a utilização de um aparelho chamado CPAP. É uma espécie de máscara, ligada a uma tubulação, que precisa ser usada toda noite. Como é muito grande e cara (entre R$ 1.500 e R$ 6.000) precisa de orientação médica constante para não ser descartada ou subutilizada pelo paciente.
A diretora do Instituto de Medicina do Sono da Unifesp, Lia Bittencourt, complementa: emagrecer, tocar instrumentos de sopro e fazer acupuntura são outros tratamentos não convencionais que estão sendo investigados, já com resultados promissores.
“É preciso procurar ajuda do médico. Costumo dizer que morrer de vergonha do ronco é pior do que morrer por causa do ronco”, compara o pneumologista Geraldo Lorenzi.
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