quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Quais os limites da palmada?

 

Caso do juiz que espancou a filha nos Estados Unidos reacende a discussão sobre como separar o propósito educacional dos maus-tratos

Renata Losso, especial para o iG São Paulo

    Foto: Getty Images Ampliar
    Limite entre educação e maus-tratos nem sempre é claro
     
    Na polêmica discussão em torno do Projeto de Lei 7672, que pretende proibir os pais de punirem fisicamente os filhos, não há unanimidade. Enquanto alguns são contra a palmada, mesmo quando classificada como “educativa”, outros são determinantemente a favor dela como última opção. A acusação da norte-americana Hillary Adams ao pai, o juiz da vara da família William Adams, por tê-la agredido repetidas vezes com um cinto ao puni-la por desobediência, coloca palmadas e os puxões de orelha em xeque: como definir a linha que separa o propósito educacional dos maus-tratos?

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    Para a terapeuta infantil Denise Dias, autora do livro “Tapa na Bunda – Como impor limites e estabelecer um relacionamento sadio com as crianças em tempos politicamente corretos” (Editora Matrix), somente o bom senso pode determinar como os pais devem ou não agir. A especialista, que é abertamente a favor da “palmada pedagógica”, torna a questão simples de ser resolvida: um pai espancar a filha e justificar o ato como educativo é como um motorista alcoolizado ser pego no bafômetro e dizer que não estava bêbado. Não há o que discutir.

    Como adultos, devemos ter o discernimento de saber o que é certo e errado. Denise Dias defende o “tapa na bunda”, mas sabe que ele deve ser usado criteriosamente. “Se uma criança derruba um copo de suco de uva no sofá e a mãe o esbofeteia, ela é desequilibrada. Agora, se a criança atira um copo na parede de propósito, aí sim ela merece um tapa na bunda – para deixar claro que ela ultrapassou todos os limites”. Porém, fica a questão: como saber se os pais também não estão ultrapassando limites?

    Palmada serve para quê?

    Em um país com tantos pais a favor da palmada como forma de educar os filhos, vale refletir sobre como os limites costumam ser colocados dentro de casa. De acordo com a terapeuta familiar Quézia Bombonatto, presidente da Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp), se as crianças compreenderem que precisam ser, de alguma forma, agredidas para serem educadas, estaremos criando uma geração que fará o mesmo com os próprios filhos. “Esta não é a melhor escolha”, defende.
     
     
    Foto: Getty Images Ampliar
    Frequência dos atos violentos é um indicador, mas perder a cabeça na hora da raiva pode ser mais fácil do que se imagina
     
    Segundo a psicopedagoga, a palmada não é necessária e um simples castigo, sem qualquer agressão envolvida, já é bem educativo. O importante mesmo é a criança entender as consequências dos próprios atos. “O limite, portanto, é colocado naquilo em que o pai não joga a própria raiva em cima”, diz. Para a especialista, violência só gera violência e não deve fazer parte da educação. Existe um objetivo a ser atingido quando se mostra um limite para uma criança. Um pai ou mãe em pleno acesso de raiva tende a perder de vista este objetivo.

    De acordo com a psicóloga Camila Guedes Henn, do Núcleo de Infância e Família (NUDIF) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), bater pode fazer com que a criança se sinta com medo e desconfiada. Se não houver uma explicação sensata para o ocorrido, pior ainda.

    Tanto a psicóloga quanto Quézia discordam que um pai deva ser condenado por uma palmada. Mas tampouco acreditam ser esta a forma mais efetiva de educar. “O limite deveria ser demonstrado com um castigo proporcional à idade da criança, uma punição que mostre as consequências daquilo que ela fez”, afirma Henn. A criança pode acabar obedecendo aos pais simplesmente por medo de levar um puxão de orelha, e não por ter entendido que fazer um escândalo quando não consegue um brinquedo é errado.


    Foto: AP Ampliar
    Hillary Adams, filha do juiz William Adams, postou na rede um vídeo em que aparece sendo espancada pelo pai
     
     
    Discurso firme
    Se as palmadas ou puxões de orelha forem recorrentes, a situação pode ser realmente perigosa. Alguma coisa está fora de controle e os pais não devem seguir este caminho.

    É preciso estar atento, portanto, à dinâmica de cada casa. Para a psicanalista Vera Zimmermann, coordenadora do Centro de Referência da Infância e Adolescência (CRIA) da Unifesp, as características culturais também contam neste momento: “Algumas famílias gritam muito e isto nunca foi sentido como agressão. No entanto, outras famílias podem produzir reações ruins somente com a alteração do tom de voz”. O mesmo acontece com as crianças. Elas podem ou não se sentir mal com uma mesma repreensão. Mas bater, principalmente bater além da conta, não é uma tática justificável.


    “A melhor correção é a firmeza na atitude e na fala”, comenta Vera. Quando não funcionar, deve-se apelar para a restrição daquilo que a criança gosta, sempre deixando claro o que é causa e o que é efeito. “Manter a autoridade com firmeza não significa violência física, nem verbal”, completa.


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