sábado, 5 de novembro de 2011

Meta ou obsessão?

 

Cumprir metas envolve determinação, foco e objetivo. É preciso cuidado para que essas características não camuflem uma obsessão

 
Verônica Mambrini, iG São Paulo
 
Foto: Getty Images Ampliar
Ter um objetivo é saudável. Mas é preciso ficar atento a sinais que indiquem se a meta pode ter se tornado uma obsessão

Quando decidiu largar a carreira de administrador para ser tradutor, Eduardo Murin, 37 anos, estava decidido. “Fiz uma especialização nos Estados Unidos e pós-graduação em tradução na Universidade de São Paulo”. Em paralelo, foi convidado a verter a novela O Clone para o inglês. “Passava a madrugada traduzindo a novela com minha filha no colo e dormia só algumas horas por dia”, lembra-se. Esse trabalho rendeu-lhe o convite para redigir dois dicionários técnicos.


O passo seguinte foi tornar-se professor universitário. “Antes dos 30 anos, realizei meu sonho de virar um professor e lingüista reconhecido”, diz o workaholic assumido, que diz trabalhar desde os 14 anos. “Para concluir essa etapa na minha vida, precisei de disciplina diária, 14 horas por dia de trabalho, e até mais, além de compreensão e apoio da família”, conta. Na sequência, Eduardo engatou a carreira como consultor e diretor de uma rede de ensino de idiomas. “Sempre me doei muito para o trabalho. Era aquele profissional que saía tarde do escritório, acabei meu mérito acabou sendo reconhecido”. Hoje, ele ainda arranja tempo para se dedicar aos cavalos, seu hobby, e morar no interior. Ao todo são 4 horas no carro por dia, mais doze de trabalho.


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Eduardo é obcecado por trabalho ou só focado nos objetivos? Apesar de ter sempre que lidar com críticas de que exagera e que não precisaria se dedicar tanto, ele está convicto e orgulhoso da própria dedicação. Para o psicólogo comportamental Elídio Almeida, o conceito daquilo que é ‘normal’ varia de pessoa para pessoa, de acordo com o contexto de cada um. “É obsessivo se o comportamento causa ansiedade e modificações na qualidade de vida. Sono perturbado, privação de relacionamentos sociais e prejuízos diversos são sinais de que a pessoa pode ter perdido o controle.”

O psicólogo Victor Dalla Nora Araujo também enfatiza a necessidade de relativizar o que seria exagerado. “Ao pontuar o que é 'normal', estamos inserindo valores próprios, e, muitas vezes, desconsiderando as particularidades do outro, que apesar fazer parte de uma mesma cultura, teve experiências diferentes das nossas”, diz.


Normal para um, difícil para o outro



Sempre que chega a época de campeonatos, o fisiculturista Julio Balestrin, 33 anos, precisa lidar com a ideia de que está exagerando na rotina de treinos ou no cuidado com a alimentação, que é extremamente controlada. “Já disseram que sou louco de praticar esse esporte. Mas o que não é loucura hoje? A nossa alimentação é muito diferente daquela das pessoas comuns. A rotina de treinamento é diferente também, assim como a importância que você dá para isso”, afirma.

No caso dele, não dá para disfarçar as demandas da prática esportiva no trabalho ou na vida pessoal. “Nós, atletas fisiculturistas, carregamos 24 horas por dia o esporte com a gente. Não tem como deixar nosso corpo em casa”, diz. Julio já ouviu até psicólogos tratarem a dedicação ao esporte como doença. “Mas é um estilo de vida. Você precisa cultivar alguns hábitos, como alimentar-se várias vezes ao dia e ter uma vida mais regrada.”


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Para Miriam Barros, psicóloga e terapeuta de casal e família, “a determinação em si não é patológica – o perigo é ela se transformar em algo patológico”.
 
Para saber se você passou o sinal vermelho entre o foco nas metas e a obsessão, Dalla Nora aponta um indício importante: a ausência de felicidade. “O obsessivo não sente prazer em sua obsessão. Ao contrário, sofre por se sentir incompleto e se sente culpado. O obsessivo convive com a sensação permanente de que falta algo, de que o que foi feito poderia ser mais bem feito.”

Outro indicador quase sempre infalível de problemas é quando nossas metas começam a causar preocupação na família e nos amigos. “Se a pessoa tem boa autoestima e uma psique saudável, ela tem maturidade para levar em consideração o que os outros falam. Ela tende a chegar a um acordo, cedendo até o ponto que considera importante”, acredita Elídio. Já a tendência dos obcecados é agir de forma extrema, passando da total rejeição e agressividade para a aceitação. A psicoterapia tenta contribuir para que as pessoas conheçam seus limites e potencialidades e se encaixem no primeiro caso.”

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