quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Polo Três Rios: incentivos atraem 872 empresas a cidade fluminense

 


Prefeitura zera impostos e promove mudanças na pacata vida de seus moradores




Valmir Moratelli, enviado a Três Rios (RJ)


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    Uma cidade com pracinha e bancos de madeira distribuídos pela calçada arborizada entre uma igreja e o prédio da prefeitura. Seria esta a melhor descrição de Três Rios, no interior do Rio de Janeiro, quase três anos atrás. Mas muita coisa mudou. A pracinha ainda está lá, mas em frente à prefeitura está erguido um dos símbolos da renovação da cidade, um novíssimo Centro de Controle e Comando, todo espelhado, conectado a 50 câmeras espalhadas pela cidade. Coisa de primeiro mundo.

    Foto: Divulgação Ampliar

    A fábrica da Nestlé foi inaugurada no dia 18 de novembro


    Três Rios, a 104 km do Rio de Janeiro, se tornou um verdadeiro polo industrial que tem transformado a paisagem e o modo de vida de seus cem mil moradores. Há obras por todos os lados. Esta repaginada é guiada pelos incentivos fiscais e atrativos empresariais que o governo municipal passou a distribuir desde fevereiro de 2009. Até o momento 872 empresas mudaram seu endereço para a cidade do interior fluminense, sendo 104 indústrias de médio e grande porte, 92 de pequeno porte e o restante empresas de serviços e comércio. E o fluxo não para. Na sexta-feira (18), foi inaugurada a maior fábrica de laticínios da Nestlé no Brasil em uma área de 95 mil metros quadrados.

    O governo do estado já permitia, desde 2002, 2% de alíquota fiscal (ICMS) para os municípios. A prefeitura de Três Rios resolveu ir além. Estão no pacote de incentivos: isenção total de IPTU por 25 anos, isenção de taxa de obras, redução do ISS a 2%, facilitação do poder público em desapropriar áreas com subsídios habitacionais, criação da Companhia de Desenvolvimento atrelada à Secretaria de Indústria e Comércio, além da desburocratização da relação público e privado.


    “O problema é dos outros 43 municípios que sentaram em cima dos 2% dados pelo governo estadual e estão esperando até hoje pelas indústrias. Pensei que isso não seria suficiente e resolvemos entrar na briga dando muito mais”, diz Vinicius Farah (PMDB), prefeito de Três Rios. Ex-jogador de futebol do time de base do Flamengo da década de 70, Farah quer mais. “Estamos fazendo de Três Rios a capital do interior fluminense”, diz ele, enfatizando que não recebe royalties do petróleo.

    Foto: George Magaraia

    Obras para facilitar o trânsito na cidade


    “Agressividade” do mercado

    Festejada com a presença do governador Sergio Cabral e de uma comitiva de políticos, a fábrica da Nestle recém-inaugurada emprega mil trabalhadores. Espera-se que impulsione o ressurgimento da bacia leiteira que, nas duas últimas décadas, estava à míngua. A fábrica começa com uma produção de 200 mil litros de leite por dia, tendo capacidade para um milhão. Foram investidos R$ 200 milhões na construção às margens da BR-040, que corta o município.

    “Todo o apoio recebido foi essencial para escolhermos Três Rios como sede da fábrica. O prefeito foi o mais agressivo, de uma velocidade ímpar, anormal para o nosso País, a fim de colocar em prática a recuperação da indústria do leite na região”, disse Ivan Zurita, presidente da Nestlé, durante a inauguração.


    Foto: George Magaraia Ampliar

    Construção de objetos de fibras visando à Copa


    Em frente à fabrica de laticínios, no outro lado da rodovia, a Latapac já se instalou para produzir latas de alumínio. Na TTR Vidros, em funcionamento há dois anos, são 70 empregados lapidando 15 mil metros quadrados de vidro por mês. O gerente da empresa Michael Kalia diz que já há planos para expansão. “O investimento foi alto, cerca de R$ 20 milhões. Ainda não deu lucro, mas já começamos as obras para aumentar o tamanho da fábrica, a maior da região serrana do estado”, diz.

    Bancos do Maracanã

    A Pifer (projetos de Interiores Ferroviários) que chegou antes e está há oito anos no município, atraída pelos incentivos fiscais (o setor ferroviário tem 0% de ICMS), segue em expansão. Ana Carolina Campos, diretora administrativa da maior indústria do setor, faz planos para fabricação de bancos para o novo Maracanã e de outros estádios da Copa do Mundo de 2014. “Compramos as máquinas que custam mais de R$ 1 milhão. Também queremos fazer o revestimento interno dos veículos BRT, que vão rodar pelo Rio de Janeiro”, planeja. Para tanto, só no último ano foram investidos R$ 2 milhões. O faturamento, segundo ela, fechou em R$ 18 milhões.

    No Condomínio Industrial, uma área particular de 236 mil metros quadrados, 35 galpões estão ocupados há quatro anos e meio com diversas fábricas – de reforma de vagões à fabricação de plástico. “E há fila de espera”, garante Fernando Rego, gerente do local, que emprega quase mil pessoas.


    Foto: George Magaraia

    Condomínio Industrial, uma área particular alugada para diferentes empresas

    Mais empresas chegando


    Entre as próximas indústrias que estão se encaminhando para aportar em Três Rios está a cervejaria Serpa. Repleta de benefícios fiscais, a empresa, cuja mantenedora tem sede na Alemanha, vai investir R$ 220 milhões na nova fábrica e prevê geração de 1300 empregos diretos. O terreno para a construção já está definido – uma área equivalente a 150 mil metros quadrados.

    A NeoBus, terceira maior empresa de carroceria de transporte coletivo do País, após um longo processo de negociação, fechou com Três Rios. Com investimentos em torno de R$ 95 milhões, deve gerar 1500 empregos diretos e ocupar uma área de 70 mil metros quadrados.

    Além disso, duas novas redes de hotéis estão em processo de finalização de projetos com a cidade. A quase inexistente rede hoteleira na cidade é, aliás, um gargalo no desenvolvimento local. Isso porque simplesmente não há quartos disponíveis nos poucos hotéis na região.

    Criminalidade diminuiu 51% em seis meses

    Se já não bastassem os impactos das mais de 800 empresas no município, todo o escoamento do SuperPorto do Açu, que Eike Batista constrói em São João da Barra, passará por ali. O prefeito Vinicius Farah diz que se preparou para o que viria a acontecer com o município após a queda à taxa zero de impostos. Há cerca de cinco anos Três Rios tinha crescente taxa de homicídios, trânsito complicado em suas ruas apertadas e uma mão de obra totalmente voltada ao trabalho rural, até então principal característica econômica da região.

    Foto: George Magaraia Ampliar

    Centro de Controle e Comando recentemente inaugurado na praça central
    Para a questão da violência, foi construído o Centro de Comando e Controle, aquele que divide a paisagem com a pracinha e a igreja. As polícias Civil e Militar, juntas, monitoram 47 câmeras fixas e três móveis espalhadas pela cidade. Segundo dados da Secretaria de Segurança, a taxa de criminalidade caiu 51% nos últimos seis meses e houve um aumento de 470 vezes na apreensão de drogas.

    Para o problema do trânsito e já antevendo sua complicação, com o aumento da frota de veículos, foi construída a primeira ciclovia do município e o deslocamento do fluxo de carros para longe do centro. Quanto à qualificação da mão de obra, as escolas municipais passaram a ter cursos técnicos noturnos, formando 2500 alunos por ano. A partir de janeiro, será inaugurado o CVT (Centro de Vocação Tecnológica), com 16 cursos, para atender 3600 alunos por ano.

    O plano diretor da cidade também foi alterado. Uma área é destinada a comércio, outra para indústrias e a terceira para residências. “Não foi fácil convencer o senhorzinho que há oitenta anos passa com seu carro na mesma rota, que agora ele precisaria aprender a fazer um novo caminho. Mudamos a direção das ruas, para dificultar o uso dos carros e forçar que as pessoas caminhem ou usem bicicleta”, diz o prefeito. O plano deu resultado.

    Problemas no percurso

    Mas ainda há muito que se fazer. Três Rios tem 11% de analfabetismo. Mesmo que não haja favelas, há várias ruas sem asfalto. Passando pela BR-040, no trecho do município, avista-se um lixão, que caminhões fazem uso de forma irregular. A prefeitura diz que já foi liberada uma verba de R$ 14 milhões do governo do estado para a construção de um aterro sanitário. As obras devem começar no começo do ano.


    Foto: George Magaraia

    Lixão às margens da rodovia federal 040, que corta o município
    Com o aumento da procura por imóveis, a especulação imobiliária tem faturado alto na região. O aluguel de um apartamento de dois quartos não sai por menos de R$ 1500, além das taxas de condomínio. Se for com vista para o rio, na avenida Beira-Mar recentemente reformada com nova iluminação e quadras poliesportivas, o aluguel de uma cobertura sobe para R$ 4000. A massoterapeuta Elizabeth Teixeira mora há quatro meses em Três Rios. Seu marido é chefe de Recursos Humanos da Nestlé. A família veio de Salvador. “Me surpreendi com o bom comércio, mas os preços estão muito salgados”, diz.

    Foto: George Magaraia Ampliar

    Aline Lopes se mudou no começo do ano com as filhas e o marido


    Estimativas dão conta de que 80% dos empregados nas empresas são moradores locais. Mas basta andar um pouco pela cidade para perceber que também há muita gente de fora. E a maior reclamação é a falta de opções de lazer. “É uma cidade ainda tranquila, gostosa de se morar. Mas não tem muito o que fazer nos fins de semana”, reclama a carioca Aline Lopes, que se mudou no começo do ano para o município acompanhada do marido, transferido para uma fábrica local.

    Só há uma sala de cinema aberta e um teatro, em um prédio da década de 60, que não tem programação regular. Resta aos trirrienses o passeio no final de tarde pela pracinha central, com o sorveteiro e o pipoqueiro típicos de qualquer cidade do interior. Pelos arredores passam os ônibus da Progresso, empresa que atua com linhas intermunicipais, e que leva no nome há cinco décadas o que só agora parece ter finalmente chegado a Três Rios.

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