Manter os conceitos de feminino e masculino aprisiona ambos os sexos a estereótipos
“A mulher pode ser feminina e ao mesmo tempo ser autônoma?” Fiz essa pergunta para mais de cem pessoas, homens e mulheres com idades variando de 20 a 55 anos. As respostas foram instantâneas e veementes: “claro”, “lógico”, “óbvio”. Em seguida coloquei a segunda questão: O que é uma mulher feminina? O comportamento de todos foi semelhante. Silêncio por algum tempo, como se tivessem sido pegos de surpresa. Hesitantes e confusas, as pessoas tentavam explicar.
Reunindo todas as respostas, surgiu o perfil da mulher feminina: delicada, frágil, sensível, cheirosa, dependente, pouco competitiva, se emociona à toa, chora com facilidade, indecisa, pouco ousada, recatada. Concluí, então, que a mulher considerada feminina é uma mulher estereotipada. Por isso, uma mulher não pode ser autônoma e feminina ao mesmo tempo. Autonomia implica ser você mesma, sem negar ou repudiar aspectos de sua personalidade para se submeter às exigências sociais. Mas isso não é uma tarefa fácil.
A primeira coisa que se quer saber quando um casal vai ter um filho é o sexo da criança. Mesmo antes do nascimento o papel social que ela deverá desempenhar está claramente definido: masculino ou feminino. Os padrões de comportamento são distintos e determinados para cada um dos sexos. Os meninos são presenteados com carrinhos, revólveres e bolas, enquanto as meninas recebem bonecas, panelinhas e mamadeiras. E isso é só o início.
A expectativa da sociedade é que as pessoas cumpram seu papel sexual, que sofre variações de acordo com a época e o lugar. Até algumas décadas atrás, não se admitia que um homem usasse cabelo comprido e muito menos brinco. Eram coisas femininas. As mulheres, por sua vez, não sonhavam usar calças, nem dirigir automóveis. Era masculino.
Na realidade, a diferença entre os sexos é anatômica e fisiológica, o resto é produto de cada cultura ou grupo social. Tanto o homem como a mulher podem ser fortes e fracos, corajosos e medrosos, agressivos e dóceis, passivos e ativos, dependendo do momento e das características que predominam em cada um, independente do sexo. Insistir em manter os conceitos de feminino e masculino é prejudicial a ambos os sexos por limitar as pessoas, aprisionando-as a estereótipos.
Na Suécia há uma tentativa de combater os estereótipos dos papéis sexuais. Uma pré-escola do distrito de Sodermalm, de Estocolmo, incorporou uma pedagogia sexualmente neutra que elimina completamente todas as referências ao sexo masculino e feminino. Os professores e funcionários da pré-escola "Egalia" evitam usar palavras como "ele" ou "ela".
A professora Jenny Johnsson, de 31 anos, disse que “a sociedade espera que as meninas sejam garotinhas gentis e elegantes, e que os meninos sejam viris, duros e expansivos. Egalia lhes dá uma oportunidade fantástica de ser quem quer que eles queiram ser”.
A diretora Lotta Rajalin disse que a escola contratou um “pedagogo de diversidade sexual” para ajudar os professores e funcionários a remover as referências masculinas e femininas na linguagem e conduta, indo ao ponto de garantir que os jogos infantis de blocos Lego e outros brinquedos de montagem sejam mantidos próximos aos brinquedos de utensílios de cozinha a fim de evitar que algum papel sexual tenha preferência.
Leia outras colunas:
As crianças poderão imaginar que possuem características consideradas masculinas e femininas, e isso amplia a perspectiva delas. Além disso, não há livros infantis tradicionais como Branca de Neve, Cinderela ou os contos de fadas clássicos, disse Rajalin. Em vez disso, as prateleiras têm livros que lidam com duplas homossexuais, mães solteiras, filhos adotados e obras sobre “maneiras modernas de brincar”. A diretora dá um exemplo concreto: “Quando as meninas estão brincando de casinha e o papel de mãe já foi pego por uma, elas começam a disputar. Então sugerimos duas ou três mães e assim por diante”.