Violência atrapalha raciocínio de crianças
Estudo conclui que efeito de exposição a homicídios pode equivaler a repetir até três vezes de ano
Thiago André, especial para o iG | 19/06/2010 09:00
Ao analisar crianças de 5 a 17 anos residentes em bairros pobres de Chicago, nos Estados Unidos, Patrick Sharkey, pesquisador do Departamento de Sociologia da Universidade de Nova York, demonstrou que elas têm seus desempenhos cognitivos reduzidos substancialmente quando expostas a atos agudos de violência.
O trabalho, publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), avaliou o efeito de homicídios, testemunhados ou não pelas crianças, sobre suas capacidades de raciocínio a partir de uma amostra de mais de seis mil casos registrados pelo Departamento de Polícia da cidade entre 1994 e 2002.
O pesquisador também utilizou estatísticas sobre o comportamento das crianças, que vivem na mesma vizinhança. Os resultados mostraram que a exposição a um homicídio ocorrido em menos de uma semana antes da avaliação foi capaz de reduzir a habilidade de leitura e vocabulário das crianças, e o efeito desses prejuízos chegou a se prolongar por até uma semana.
“A exposição aos homicídios fez com que os resultados dos testes cognitivos das crianças fossem, em linhas gerais, reduzidos entre metade e dois terços. Isso significa que essa exposição seria equivalente a dois ou três anos de escolaridade perdidos pelas crianças”, o pesquisador explicou ao iG. De acordo com o trabalho, incidentes de violência extrema afetam as crianças do ponto de vista cognitivo, emocional e até no que diz respeito a sintomas relacionados ao estresse pós-traumático, incluindo insônia, ansiedade e dificuldade de concentração.
O efeito foi mais marcante entre as crianças afro-descendentes do que nas hispânicas, segundo o estudo. O impacto também variava de acordo com a proximidade do homicídio à residência da criança: as maiores perdas cognitivas foram verificadas quando o crime ocorreu em ambientes mais próximos das crianças.
Em outros lugares
Segundo o pesquisador, o estudo foi realizado em Chicago, “que está entre as poucas cidades norte-americanas cujos atos de violência e de segregação racial estão concentrados em bairros específicos da cidade”.
“Por isso é difícil afirmar se as conclusões encontradas em Chicago seriam semelhantes às de outras cidades do mundo. Antes de falarmos sobre a universalidade de seus resultados, seria preciso repetir o estudo em diferentes configurações”, disse.
Mas, para Sharkey, é bem provável que crianças expostas à violência extrema em qualquer cidade do planeta apresentem déficits similares no funcionamento cognitivo. “Pesquisadores com acesso a estatísticas de violência em cidades como o Rio de Janeiro, por exemplo, que enfrenta problemas semelhantes aos de Chicago, podem se sentir à vontade para replicar o método científico utilizado em meu estudo. Isso geraria uma maior urgência nas autoridades para enfrentar o problema da violência onde quer que ela ocorra”.
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