domingo, 13 de junho de 2010

O cérebro do corrupto é diferente?
Pesquisadores estão reunidos para achar a resposta desta pergunta
Fernanda Aranda, iG São Paulo | 11/06/2010 20:36

Neurocientistas do Brasil estão empenhados em encontrar um ponto em comum entre o político que transporta dinheiro ilegal na cueca, o prefeito que desvia milhões do orçamento publico para sua conta bancária no exterior e aquele vizinho que pede parte do salário do outro emprestado, jura que vai pagar e some logo após o golpe.


Se a população aposta em “falta de vergonha” como semelhança entre os três exemplos, os pesquisadores trabalham com a hipótese de existirem outras áreas de convergência entre os corruptos de qualquer espécie.

Mais de 300 especialistas, entre psicólogos, psiquiatras e neurologistas, estão reunidos no 6º Congresso de Cérebro, Comportamento e Emoções – que acontece durante este final de semana no Rio Grande do Sul – para discutir se existem alterações biológicas no organismo de quem pratica a corrupção.

Em entrevista ao Delas, o médico organizador do Congresso, André Palmini – pós doutor em neuroimagem funcional pela Universidade Leuvene, da Bélgica – diz que o objetivo da discussão é audacioso: ser o ponto de partida para criar estratégias de prevenção a indivíduos corruptos na sociedade.

Delas: Já existem evidências científicas de que o cérebro dos corruptos é diferente?

Palmini: Ainda não há literatura nem trabalhos científicos que mostrem, de forma clara, esta relação. Em contrapartida, temos evidências sólidas, já publicadas, de que pessoas que apresentam comportamentos antissociais, como os que cometem violência, os psicopatas e os dependentes químicos, têm alterações cerebrais significativas e já mapeadas. No congresso, vamos reunir toda esta bibliografia, revisar os estudos para aprofundar a hipótese de que essas alterações cerebrais também são presentes em pessoas vulneráveis à corrupção. Hoje já existem exames de imagem, de alta tecnologia, que conseguem mostrar as conexões dentro do cérebro e que podem estar relacionadas a este tipo de comportamento.

Delas: Qual o objetivo de investir neste tipo de trabalho? É possível pensar em políticas preventivas para seres humanos corruptos?
         
Palmini: Já é possível imaginar que num futuro não muito distante será possível identificar quais indivíduos têm maior risco de cometer os chamados antissociais por meio de exames de imagem cerebral (ressonância magnética é um exemplo). E isso é fundamental para intervenções mais assertivas, não médicas, mas também sociais e educacionais. É possível, inclusive, fazer acompanhamentos periódicos de diagnóstico de imagem para apurar o que está surtindo efeito. Não sabemos ainda como prevenir a vulnerabilidade à corrupção, mas podemos identificar como alterar circuitos cerebrais que amenizam essa característica.

Delas: Mas cogitar as alterações cerebrais em indivíduos corruptos não é, de certa forma, diminuir a importância do meio na formação dessas características?

Palmini: Não há a menor dúvida de que a genética molda o cérebro. O que se discute é o peso de cada fator, seja genético ou social. Algumas pessoas são mais predispostas do que outras a praticar certos tipos de comportamentos e a ocasião, o meio e a sociedade podem incentivar certas posturas. É um mix de fatores. No caso da corrupção já sabemos que a impunidade é grande incentivadora.

Delas: Quando falamos em influência genética, pensamos em hereditariedade. Ou seja, pensamos que o mesmo tipo de comportamento já existiu em um pai, avô ou tio. Isso se confirma?

Palmini: Não necessariamente. De forma grosseira, podemos dizer que no processo de passagem dos genes dos pais para os filhos acontecem mutações e transformações que podem resultar nessas características. Sem contar que as experiências também modificam os genes. A genética sofre interferência da experiência de vida. Um menino abusado pelo pai, por exemplo, pode ter os genes alterados por isso.

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