Ideb cria cultura de avaliação, opinam especialistas
Apesar de limitações, notas para ensino levam gestores e educadores a repensar práticas pedagógicas e buscar alternativas
Priscilla Borges, enviada especial à Bahia | 26/08/2010 07:01O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) está criando uma cultura de avaliação no País. A opinião da pedagoga Mônica Samia é compartilhada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), que já realizou duas pesquisas sobre os impactos causados pela divulgação das notas que medem o ensino nos municípios brasileiros, desde 2007.
Apesar de reconhecer limitações nas estatísticas para avaliar todos os fatores que influenciam a qualidade de ensino nas escolas, Mônica acredita que o Ideb contribui para que professores, coordenadores, diretores e secretários repensem o próprio trabalho. “Ele possui falhas, mas retrata alguma coisa. O Ideb impulsionou as redes a quererem melhorar”, diz.
Calculado a partir das notas dos estudantes em provas de português e matemática, aplicadas na 4ª e na 8ª séries, e das taxas de aprovação dos alunos, o Ideb estabelece metas de crescimento para cada escola, rede, município e Estado. As duas variáveis foram escolhidas para medir o conhecimento dos estudantes e o quanto elas estão avançando nos estudos.
A educadora Maria de Salete Silva, coordenadora do programa de educação do Unicef no Brasil, acredita que os brasileiros precisam mudar o modo como encaram a avaliação. “Dar nota é sempre vinculado à punição, mas o grande objetivo da avaliação deve ser a melhoria. O Ideb é apenas um indicador, mas provocou mudanças em diferentes áreas nos municípios que cresceram as médias”, analisa.
O iG percorreu, no início do mês, mais de 1.000 quilômetros pela Bahia, o Estado que amarga algumas das notas mais baixas do Brasil no Ideb, em busca de conhecer a realidade por trás dos números e as justificativas do sucesso e do fracasso de escolas e municípios no processo educacional. Desde domingo, uma série de reportagens mostrou a realidade de quatro municípios: Apuarema, Dário Meira, Jussari e Boa
Vista do Tupim.
A convite do iG, Mônica acompanhou a equipe de reportagem em visitas às escolas de Jussari, localizada a 80 quilômetros ao sul de Ilhéus. Ela se impressionou com a descrença de alunos e professores. “Os estudantes não se sentem parte da escola. Os professores não têm compromisso com os alunos”, diz.
Os municípios visitados são apenas exemplos que se repetem em todo o País. Na Bahia, Mônica ressalta que o descaso com a educação é histórico. “As disputas políticas afetam muito o trabalho de gestão das secretarias municipais e acabam chegando às escolas, como ocorre em Jussari. Isso é cruel com os estudantes”, analisa.
Mudanças de postura
A última pesquisa coordenada por Mônica – Caminhos do Direito de Aprender – analisou municípios que foram mal avaliados e conseguiram melhorar o desempenho. Em todos, a vergonha de estar na lanterna os fez mudar. Em Apuarema, município com pior nota na 4ª série, professores e diretores envergonhados sentem o peso de estar no final da lista.
A falta de infraestrutura física das escolas, os problemas socioeconômicos dos municípios, os recursos escassos para investimentos em professores e colégios e a pouca participação dos pais na vida escolar dos filhos não impediram que gestores e educadores cruzassem os braços.
“Espaços adequados e limpos e bons materiais são direitos. As escolas não resolverão sozinhas todos os problemas sociais de onde estão inseridas. Mas os profissionais da educação não podem se isentar da responsabilidade que têm e deixar de buscar alternativas para que os alunos aprendam”, pondera Mônica Samia. Em Boa Vista do Tupim, a postura dos profissionais foi essencial nesse processo.
Especialista em formação de professores, Mônica critica a naturalização do fracasso escolar. “As escolas serem ruins e meninos não aprenderem é mais natural para o País do que eles irem bem. Essa cultura nociva está enraizada nas pessoas. Com a divulgação de resultados, isso está sendo rompido, porque aparece para a sociedade”, analisa.
Eni Bastos, superintendente de Avaliação da Secretaria da Educação do Estado da Bahia, concorda. “Desde que o Ideb foi criado, a imprensa, a sociedade, as famílias acompanham o desempenho das escolas, querem saber se elas estão bem ou não. É importante termos uma avaliação externa, que possamos definir políticas para melhorar”, afirma. A superindente diz que os resultados nada confortáveis dos municípios baianos fizeram com que a secretaria estadual decidisse ajudá-los a melhorar.
Segundo Eni, serão realizados encontros com os gestores municipais para explicarem a importância e o funcionamento do índice este ano. Depois, eles pretendem organizar cursos de capacitação para os gestores e os professores. “Não vamos conseguir melhorar a rede estadual se não trabalharmos com a municipal. Precisamos identificar as dificuldades deles o quanto antes, para que eles aprendam”, defende.
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