segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Bater em crianças: crime ou educação?
Em mais de 20 países, bater no filho pode levar os pais à cadeia. No Brasil, campanhas buscam colocar fim à “palmada pedagógica”
Clarissa Passos, iG São Paulo | 15/12/2009 13:17

Em agosto deste ano, depois de um polêmico referendo realizado pelo correio, a Nova Zelândia consultou a população sobre a lei conhecida como “antipalmada”, promulgada em 2007, que torna crime dar uma palmada nos filhos. A maioria das pessoas, 87,6% dos eleitores, votou pela extinção da lei, ou seja, quer voltar a ter o direito de dar uma palmada “pedagógica” nos filhos. O governo neozelandês, no entanto, ainda não decidiu se vai alterar a legislação e revogar, de fato, a lei.

Na Suécia, desde 1979, bater em uma criança – ainda que seja um eventual tapinha depois de uma malcriação – pode levar os pais para a cadeia. O país foi o primeiro a proibir as palmadas “padagógicas”. Na América Latina, Uruguai, Venezuela e Costa Rica já seguiram o exemplo sueco e enquadraram a palmada como crime. Além deles, países como Alemanha, Áustria, Espanha, Portugal e Israel também criaram leis criminais que protegem a criança de eventuais palmadas, ainda que seja com o intuito de educá-la.

No Brasil, o tapinha visto como educacional não é crime e continua sendo socialmente aceito – desde que ocorrido no âmbito familiar. “Aqui, a chamada palmada pedagógica não é penalizada do ponto de vista criminal. Agora, se ela levar a algum tipo de dano físico, pode ser enquadrada como lesão corporal”, define Paulo Afonso Garrido de Paula, procurador de Justiça do Estado de São Paulo, professor de Direito da Criança e do Adolescente da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).

De acordo com o promotor, que também é um dos autores do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), tornar crime o hábito de dar palmadas ainda não é o melhor caminho para o Brasil. “Criminalizar é complicado porque é difícil determinar os limites da palmada pedagógica”, diz.

O ideal seria apostar primeiro em uma mudança cultural. “O caminho é investir em campanhas educativas, que expliquem que não é causando dor que você vai conseguir educar bem”, opina Paulo. Uma das iniciativas desse tipo no Brasil é a rede “Não Bata, Eduque”, que visa contribuir para o fim da prática da palmada como instrumento de educação. Nascida em 2005, a rede conta com o apoio de várias instituições, como a Fundação Xuxa Meneghel, capitaneada pela apresentadora.

Leis brasileiras

No Brasil, a lei é guiada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. A primeira parte do Estatuto proclama os direitos essenciais dos menores, como o direito à integridade física, moral e espiritual. A segunda parte criminaliza algumas condutas, como submeter uma criança a vexame ou constrangimento – coisa que pode ser feita mesmo sem palmadas.

O Estatuto também obriga que agentes da saúde, professores ou outros profissionais sociais que tenham relação com a criança denunciem qualquer suspeita de abuso ou maus-tratos.

Mas, afinal, bater para educar funciona? Para Maria Irene Maluf, pedagoga especialista em Psicopedagogia e Educação Especial, a resposta é clara: bater não funciona. “O tapa pode resolver na hora, principalmente quando a criança raramente é repreendida dessa forma, mas não ensina o autocontrole”, alerta. O melhor é mostrar por meio de repetições e do estabelecimento claro de limites.

Aos adultos que ainda acreditam que um filho que não apanha vira uma criança sem limites, a pedagoga explica que ocorre o inverso: pais que sempre recorrem às palmadas é que podem perder os parâmetros. “Agressões são formas de desrespeito e deixam marcas de rejeição. Ou acovardam diante da vida ou criam brutamontes que farão ainda pior com seus próprios filhos”, diz ela.

Um comentário:

Guilherme disse...

Alguns adultos dirão que apanharam na infância e não veem nenhum mal nisso. Talvez seja uma forma de reconhecer a eficiência da medida ou reforçar o comportamento que hoje, com eles, se repete na "educação" dos filhos. No entanto, acredito que essa seja uma energia velha, que veio passando de pai para filho, sem se levar em conta os traumas que ela pode causar, em nome dessa pseudoeducação. Por isso, penso que métodos mais decentes e racionais de educação devem ser tema de estudo na sociedade atual. Chega de legitimar os atos de violência. E ela, muitas vezes, começa em casa.