terça-feira, 31 de agosto de 2010

Em Dário Meira, gestores tentam compreender nota no Ideb
Iniciativas são pequenas diante dos desafios, como professores sem formação adequada e escolas sem projeto pedagógico
Priscilla Borges, enviada especial a Dário Meira (BA) | 24/08/2010 07:00

“A cidade está abandonada”. Assim o microempresário João Oliveira descreve entristecido o próprio município, Dário Meira. Dono de uma pousada, ele faz críticas aos gestores locais e revela preocupação quanto ao futuro dos 3,6 mil estudantes da cidade. “As escolas estão ruins, as aulas acabam cedo. É uma tristeza”, garante.

Além de acompanhar de perto o calendário escolar do próprio filho, Oliveira se baseia em outro dado para afirmar que os colégios do município não vão bem. A cidade de Dário Meira, distante 400 quilômetros da capital da Bahia, Salvador, está entre as piores do Brasil no índice que mede a qualidade da educação. Nos colégios, faltam bibliotecas, laboratório de ciências e de informática.

As escolas de 1ª a 4ª séries do município alcançaram, em 2009, nota 2,2 no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Nas séries finais (5ª a 8ª), o resultado não é mais animador: 2,9. Criado pelo Ministério da Educação em 2007, o Ideb pretende impulsionar a melhoria do ensino nas escolas públicas do País.

A partir do diagnóstico feito pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), considerando o desempenho de estudantes na 4ª e na 8ª séries do ensino fundamental e a quantidade de alunos aprovados pelas escolas, o MEC estabeleceu metas de crescimento nas médias para cada escola, rede, município e Estado do Brasil.

Dário Meira não conseguiu atingir a meta projetada para 2009 nas séries iniciais, que era de 2,8. Apesar de ter cumprido o objetivo estabelecido pelo MEC para a 8ª série (2,8), a nota ainda está bem distante do ensino de qualidade sonhado pelo ministério: 6,00.

O abandono descrito por João impressiona quem chega desavisado. Em plena segunda-feira, durante o dia, quando a equipe de reportagem do iG chegou à cidade, poucas pessoas circulavam pelas ruas. O comércio parecia fechado. Não era feriado local. Os 12 mil habitantes de Apuarema estão espalhados em distritos e fazendas na área rural. Não há centros culturais que promovam atividades para reunir os jovens.

No município, a única biblioteca também não recebe muitos estudantes, que não se sentem atraídos pelos três mil volumes do pequeno acervo disponível. Quando os jovens aparecem por lá, é para usar os computadores para fazer pesquisas. Stefany dos Santos Pereira, 13 anos, admite que tem frequentado muito o local. Sempre para fazer trabalhos escolares no computador. Aluna da 8ª série, ela gostaria que a escola oferecesse o que ela não tem em casa: livros e computadores.

Desiludido, João pretende matricular o filho em uma escola de um município próximo. Mas a Secretaria Municipal de Educação de Dário Meira se defende e diz que não há motivos para desacreditar nos esforços feitos por eles para garantir a aprendizagem dos alunos. Diretores, professores e o secretário de Educação, Eliabe Café, não se conformam com a nota recebida pelo município no Ideb e garantem que ela não reflete o
que acontece nas salas de aula das 25 escolas municipais.

Faltam professores e capacitação

O secretário garante que, a partir de diagnósticos feitos nas escolas desde 2007, quando assumiu a secretaria, coloca planos de ação em prática para melhorar a qualidade da educação. Materiais, como projetores, foram comprados para as escolas. Hoje, apenas 50% dos 190 docentes do município têm título de graduação, mas a secretaria apoia os interessados.

A prefeitura mantém uma casa alugada em uma cidade próxima para ajudar os 30 professores que estão terminando a faculdade. Eliabe reconhece, no entanto, que o município ainda precisa de professores licenciados nas áreas de história, física, química e matemática.

O pedagogo José de Lima, por exemplo, é um dos professores do município que dá aulas fora de sua formação. Estudante de filosofia, ele ensina história para as séries finais do ensino fundamental no Centro Educacional de Dário Meira. Lima acredita que todos têm parcela de culpa pelo resultado de Dário Meira no Ideb.

“Muitos professores não se preparam direito, o município deixa faltar recursos, os alunos não se comprometem com os estudos e os pais não acompanham os filhos. A gente faz reuniões e ninguém participa”, lamenta.

Há fatores apontados pelos profissionais da educação externos à escola que também fazem diferença para a aprendizagem dos alunos. As famílias, segundo eles, não participam da vida escolar dos filhos. A preocupação dos pais, muitas vezes, é a sobrevivência. Entre os 12,3 mil habitantes, 1.996 famílias se mantêm com o Bolsa Família. Toda semana, dezenas de moradores fazem fila na prefeitura para pedir ajuda para comprar remédios, fazer exames, pedir cesta básica.

No entanto, muitos estudantes se mostram com vontade de aprender nas salas de aula. Victor Pereira, de 13 anos, por exemplo, garante que adora a escola. Ele elogia a qualidade das aulas e diz que pretende seguir os estudos, assim como Camila Gomes, 13. “Quero ser uma cientista”, diz a menina. Outros já desanimam, em função da falta de perspectivas de emprego e de entrar em uma universidade – não há nenhuma no local, apenas dois pólos de faculdades privadas. “Quero terminar o ensino médio. Mas só. Não penso em fazer uma faculdade”, admite Paulo Cézar Silva, 14.

OS DESAFIOS DO MUNICÍPIO (segundo professores, diretores, pais e alunos)
- Elaborar projetos pedagógicos nas escolas para orientar trabalho dos professores
- Acabar com os professores “leigos” – sem graduação – do quadro
- Reformular o plano de carreira dos docentes, ampliar o regime de trabalho da maioria para 40 horas semanais e remunerá-los melhor (hoje, o salário é de R$ 669, sem gratificações, por 20 horas
- Aumentar o programa de aulas de reforço para os alunos

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