segunda-feira, 16 de maio de 2011

Naturalmente inteligentes

Naturalmente inteligentes

Elisa Marconi e Francisco Bicudo
Publicado em 13/5/2011

Segundo o psicólogo norte-americano Howard Gardner – pesquisador da Universidade Harvard –, os seres humanos possuem oito inteligências distintas e ao mesmo tempo complementares: a lógico-matemática; a linguística; a corporal-cinestésica; a musical; a espacial; a intrapessoal; a interpessoal e a naturalista. Longe de querer classificar ou rotular as pessoas a partir de suas habilidades, o psicólogo cognitivo busca antes entender as variadas manifestações das competências humanas, como prova de que somos todos inteligentes, sem hierarquias ou escalas de importância. A capacidade de resolver problemas matemáticos seria portanto – segundo a teoria das Inteligências Múltiplas por ele formulada – tão valorosa quanto a capacidade de se movimentar no espaço, ou de falar claramente, ou de se conhecer profundamente, ou ainda de se relacionar harmoniosamente com os pares.

Os estudos de Gardner remontam ao início dos anos 1980 e já conquistaram uma série de seguidores mundo afora. Aqui no Brasil, a pedagoga Rosana Spinelli dos Santos trabalha há anos com esses conceitos para, entre outras finalidades, mostrar a professores e autoridades da educação que conhecer as oito inteligências pode ser uma boa maneira de estimular os estudantes a desenvolver outras competências e a se perceberem mais inteligentes do que muitas vezes se imaginam.

Segundo a professora, a busca pelo entendimento do que se convencionou chamar de inteligência começou no início do século XX, capitaneada pelo médico e cientista natural francês Alfred Binet (1857-1911). Naquele momento, o objetivo era apenas diagnosticar certos déficits de inteligência de crianças francesas. Depois que o teste para tal fim foi criado por Binet e posteriormente aplicado em soldados norte-americanos, o pesquisador se popularizou e virou sinônimo de inteligência. A pedagoga reforça que esse não era o intuito do instrumento de avaliação e que nem seu idealizador acreditava que fosse possível medir competências intelectuais dessa maneira. Contudo, entre a meta de Binet e o que acabou sendo absorvido pelo senso comum, estabeleceu-se distância enorme. Por isso a proposta de Gardner veio suprir uma significativa carência dos estudiosos da área: ao perceber e nomear os distintos tipos de inteligência, o pesquisador norte-americano sugeriu também que elas são complementares e caminham juntas, atuam e se alimentam mutuamente.

“Inteligência não aumenta, mas se multiplica”

“A questão é que cada um de nós nasce com pelo menos uma inteligência desenvolvida, mas com a potência inata de manifestar todas as oito. O que acontece é que a gente acaba desenvolvendo mais apenas duas ou três dessas inteligências, sobram cinco ou seis que ficam no limite mínimo”, lança a isca Rosana. Trocando em miúdos, seria uma falácia a velha conversa de que a pessoa que nasce para as humanas não tem jeito para exatas e, portanto, nem vale a pena estudar disciplinas dessa área. “Existe um fator natural, mas existem mais fortemente fatores culturais que acabam determinando as inclinações da pessoa”, explica a pedagoga, pós-graduada em Didática do Ensino Superior, que já atuou como coordenadora pedagógica, orientadora educacional e profissional e atualmente é professora na Faculdade para a 3ª idade. Ela lembra que o ambiente influencia na emergência de certas capacidades – é tão importante um índio saber se deslocar na floresta quanto um relações-públicas conseguir se comunicar bem com sua equipe de trabalho – mas as sementes para o desenvolvimento de todas as outras estão em cada pessoa. São inatas, segundo Rosana.

O segredo para potencializar as competências negligenciadas é “treinar”, garante a pedagoga. “Inteligência não aumenta, mas se multiplica. O sujeito precisa primeiro desenvolver a inteligência intrapessoal – aquele entendimento dele mesmo – para se conhecer bem e saber seus pontos fortes e menos cuidados. Aí é começar a trabalhar”.

A teoria de Gardner ainda assegura que sempre é tempo de começar a estimular outras inteligências. “Eu dou aula na Faculdade da 3ª idade e as alunas estão ali para não deixar o cérebro envelhecer e a inteligência morrer. E elas conseguem”, conta a professora. Palavras cruzadas, por exemplo, é uma atividade que precisa de múltiplas inteligências para ser efetivada. “Não é só saber a língua, é saber a lógica, os espaços e por aí vai”, provoca Rosana. E para que serve multiplicar as competências? “Para viver melhor. Se a pessoa quer mudar de vida, conhecer outras possibilidades, mudar de profissão. E até para que o padrão do que se considera inteligência mude”, propõe.

Caracterização das inteligências

Rosana levanta a questão mais delicada relacionada à medição e à caracterização das inteligências. Tradicionalmente, a sociedade só reconhece alguns tipos de inteligência como mais valorosas. A lingüística-verbal e a lógico-matemática são mais bem consideradas. “A escola foi muito eficiente nesse ponto. Bateu tanto nessa tecla que conseguiu convencer a sociedade de que inteligência se mede assim”. A boa notícia, na opinião da pedagoga, é que se a escola foi bem sucedida na sua campanha de levantar o valor de duas inteligências, também será se quiser ensinar e divulgar as outras seis. Aliás, ela lembra, alguns colégios já estão adotando medidas que combinam com essa ideia: vão desde o ensino do xadrez, que trabalhas variadas competências, até a adoção de projetos transdisciplinares, ou de conteúdos transversais.

“Mas ainda está no começo. De um modo geral, as escolas são conteudistas e acreditam que medir o grau de retenção da informação é a melhor maneira de averiguar o desenvolvimento dos estudantes. Além disso, as escolas crêem piamente no modelo de ensino por disciplinas estanques e que não se tocam, não se comunicam”, explica a professora da Faculdade da 3ª idade.

Para ela, quando diretores e coordenadores pedagógicos entendem que o conhecimento não precisa ser compartimentado, que os conteúdos são fluidos e motivam novos conteúdos, encontram na teoria das Inteligências Múltiplas um amparo teórico para propor um novo olhar para o método desenvolvido em cada escola. “É parecido com o que acontece na internet e por isso os jovens gostam tanto. Cada informação chama outra e outra, e um texto, e uma foto. No fim da navegação, você tem uma visão global do assunto”, ensina Rosana, que continua: “descompartimentar o conhecimento e a produção escolar é uma ideia bem aceita por professores que, na sala de aula, já percebem que alguns alunos se expressam melhor por textos, outros por desenhos e outros por movimentos corporais”.

Os educadores, portanto, costumam ficar entusiasmados com os novos caminhos que se abrem, embora admitam, de acordo com Rosana, que a própria formação universitária precisa mudar para dar conta dessas ideias. Enquanto isso não acontece, quem se interessar em trabalhar com as inteligências múltiplas pode buscar atividades que não desviem do conteúdo que precisa ser ministrado, mas que somem outras capacidades. Já falamos de palavras cruzadas e xadrez, mas são muitas outras. Poesia, por exemplo. “Gardner diz que ler por ler não vale nada”, lembra Rosana. Mas, ela ensina, quando você lê uma poesia e precisa contar para seus amigos com suas palavras, seus desenhos ou sua dança o que aquela poesia diz ou significa para você, aí você está trabalhando as múltiplas competências e inteligências que já nasceram com você e que – talvez – ainda não tinham tido a chance de se expressar.

SERVIÇO
Curso Inteligências Múltiplas
Conteúdo: Conceito antigo e atual de inteligência; como aguçar as oito inteligências no dia-a-dia familiar e escolar
Professora: Rosana Spinelli dos Santos - Pedagoga; pós-graduada em Didática do Ensino Superior; atuou como professora, coordenadora pedagógica; orientadora educacional e profissional; atualmente é professora na faculdade para a 3ª idade, palestrante e consultora em gestão de pessoas
Dia: 25 de maio, das 19h às 22h
No SINPRO-SP
 
FONTE: SITE DO SIMPRO-SP

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