segunda-feira, 24 de maio de 2010

Será que isto é legal. Excelência?

Será que isto é legal, Excelência?

Gostaria que os colegas professores e também todos os cidadãos de Minas, e por que não de todo o país, fizessem uma reflexão a partir de alguns princípios constitucionais que vêm sendo, diuturnamente, desrespeitados, em nosso país, principalmente, por aqueles que têm o dever funcional de, exemplarmente, cumpri-los e, posteriormente, zelar pelo integral cumprimento de todos eles, sem exceção.

A inobservância do cumprimento destes preceitos constitucionais quebra a expectativa de justiça e gera uma sensação de insegurança muito grande na população. Afinal todos que chegaram ao pode, via eleição, estão lá para representar o povo, pois “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos...” (Parágrafo único, artigo 1º da CF).

Ao observar cada um destes princípios e compará-los à nossa realidade, espero que pensem no conceito do que é ou não legal. Por isso é que aparece, após a exposição de alguns princípios legais, a pergunta: Isso é legal?
Então, por gentileza, sigamos:

• “O salário mínimo deve ser capaz de atender às necessidades básicas de uma família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social...” (artigo 7º, inciso IV da CF).

No entanto, um Assistente Técnico de Educação Básica – ATB1A – tem como vencimento básico R$334,04 enquanto o salário mínimo é de R$510,00. Esses valores não atendem às necessidades básicas de uma família. Isso é legal?

• “É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.” (Artigo 9º).
• “O direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica” (Artigo 37, inciso VII da CF).

Porém nunca houve interesse, por parte dos representantes do povo, deputados e senadores, em regulamentar essa exigência. Isso é legal?

Entretanto, o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Mandado de Injunção nº. 708, regulamentou o direito de greve dos servidores públicos. Nesse sentido veja as palavras do Ministro Celso de Mello proferidas na sessão de julgamento ocorrida no dia 25 de outubro de 2007 que expressam a visão da Suprema Corte e, por sua relevância, transcrevo:

• “Não se pode tolerar sob pena de fraudar-se a vontade da Constituição, esse estado de continuada, inaceitável, irrazoável e abusiva inércia do Congresso Nacional, cuja omissão, além de lesiva ao direito dos servidores públicos civis – a quem vem se negando, arbitrariamente, o exercício do direito de greve, já assegurado pelo texto constitucional -, traduz um incompreensível sentimento de desapreço pela autoridade, pelo valor e pelo alto significado de que se reveste a Constituição da República.”

Não obstante, uma sentença com fundamentos e motivações essencialmente políticos decreta a ilegalidade do movimento grevista dos profissionais da educação de Minas Gerais. Isso é legal?

• “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza...” (Artigo 5º da CF).
As greves iniciadas sob o comando de vários sindicalistas, entre eles Luís Inácio Lula da Silva, no passado, eram legais. Impedir, hoje, que servidores públicos exerçam esse mesmo direito afronta tanto o artigo 5º da CF como também a decisão do Supremo Tribunal Federal. Isso é legal?

• “Ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas.” (Artigo 8º, inciso III, CF).

Só que aos olhos da Justiça, que é cega, o exercício desse direito, por parte do sindicato, é ilegal, razão pela qual, houve várias retaliações, inclusive com multa inicial de dez mil reais diária e, posteriormente, majorada para trinta mil reais. Isso é legal?

• “A lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.” (Artigo 9º, parágrafo 1º, CF).
A lei nº7.783, DE 28 DE JUNHO DE 1989 – Lei de Greve -, dispõe sobre o exercício do direito de greve, define as atividades essenciais, regula o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, e dá outras providências.
O artigo 10 dessa lei dispõe, taxativamente, que serviços e atividades essenciais são:
• “Tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; assistência médica e hospitalar; distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos; funerários; transporte coletivo; capitação e tratamento de esgoto e lixo; telecomunicações; guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares; processamento de dados ligados a serviços essenciais; controle de tráfego aéreo; compensação bancária.”
Percebe-se, portanto, que “educação” não foi considerada pelo legislador como serviço ou atividade essencial, entretanto o desembargador do Tribunal de Minas, usurpando competência exclusiva do Poder Legislativo, avoca para si o poder de legislar. Isso é legal?
• “O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
• (...);
• V- valorização dos profissionais do ensino, garantidos, na forma da lei, planos de carreira para o magistério público, com piso salarial profissional e ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos.” (Artigo 206, inciso V, CF).
Ao falar em valorização dos profissionais do ensino, é bom não esquecer que esse profissional, em Minas, nos últimos quatorze anos, além de não ter sido valorizado, foi ignorado, esquecido, jogado às traças. Isso caracteriza descumprimento desse princípio constitucional. Mas não é tudo, pois a Lei 100, que efetivou vários servidores da educação sem concurso público, afronta, uma vez mais, ao desrespeitar a exigência de concurso público para ingresso na carreira, sem, contudo, levar em conta o excessivo número de designados (contratados) na Educação Mineira. Isso é legal?

• “A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.” (Artigo 37, inciso XXII, parágrafo 1º, CF).

Apesar do impedimento constitucional, o presidente, os governadores e prefeitos, que são servidores públicos, se autopromovem em toda e qualquer publicidade, gastando, indevidamente, milhões e milhões de recursos públicos, que deveriam ser aplicados na saúde, educação, segurança pública e em outras áreas de interesse coletivo, além de alimentar a sede voraz de certa parte da imprensa que, para abocanhar um enorme quinhão dessa fonte inesgotável de recursos, se cala e se faz parceira dos gestores públicos, desvirtuando,com essa postura, sua principal razão de ser, que é levar à população a informação verdadeira.

Contudo aqueles que deveriam zelar pelo cumprimento dos mandamentos legais e constitucionais, utilizando de todos os mecanismos processuais de que necessitam para coibir essas ilegalidades, simplesmente, pelo que se sabe, nunca, nunca, nunca... fizeram nada. Isso é legal?

Portanto, meus amigos professores, ilegal não é o exercício da cidadania. Não é se organizar ordeira e pacificamente nas praças de todas as cidades de Minas, principalmente, nas da capital, para manifestar seu descontentamento com a omissão, a mentira, o desmando, o despotismo. Ilegal é esse desprezo com que as autoridades, em sua maioria, em todas as esferas de poder, lidam com a coisa pública.

Que os nossos políticos acordem para essa realidade de injustiça que há muito vem se desenhando Brasil a fora. Pois, a história nos mostra que a reação da grande massa injustiçada pode desestabilizar qualquer governo, principalmente, quando essa massa tem a capacidade de mobilização. Oxalá isso não seja necessário em um país tão belo, agraciado com tantas maravilhas naturais e, principalmente, pela riqueza e diversidade da nossa cultura, de nosso povo. Tudo dependerá da competência, seriedade e comprometimento do gestor público com aquilo que é todos, não somente dele e de seus auxiliares.

Afinal, DEMOCRACIA, não é só o voto. Democracia significa uma justa distribuição de rendas; independência entre os poderes; segurança pública, saúde e educação de qualidade; transparência na gestão da coisa pública; igualdade de oportunidades para todos, sem qualquer tipo de discriminação ou preconceito.

Se isso, a rigor, não se efetivar, certamente a pátria jamais alcançará um dos seus objetivos fundamentais: uma sociedade livre, justa e solidária. (Artigo 3º, inciso I, CF). Pois, onde não há JUSTIÇA, não há PAZ SOCIAL.

E, para concluir, espero que a manifestação do pensamento seja respeitada, conforme o inciso IV, do artigo 5º da Constituição Federal.


Professor Guilherme A. Dias

3 comentários:

Carmem Brandão disse...

Guilherme,
Hoje li seu texto sobre a legalidade ou ilegalidade da greve. Vindo de você só podia ser um texto inteligente, coerente, de bom senso. As pessoas precisam é disso mesmo Ler textos que as façam refletir, pensar nas coisas que estão acontecendo às nossas voltas e nem sempre as enxergamos. Com essa greve, percebi que estava trancada numa sala de aula, carregando uma carga pesada, que estava me levando a várias enfermidades; e eu mal percebia, por consequencia do estresse, o que estava se passando. A greve, antes de tudo, serviu pra abrir os olhos de muita gente. Serviu pra despertar o senso político das pessoas, para que tenhamos rumos novos e conscientes daquilo que queremos, pois ultimamente o povo está "dançado conforme a dança", sem questionar, sem avaliar. Se estamos assim, como vamos formar cidadãos críticos, coesos em seus posicionamentos?

Continue escrevendo. Seu trabalho é muito bom.
Um abraço,

Professora Carmem Brandão

Guilherme disse...

Palavras e escritora! Obrigado, Carmen.

Ladica disse...

Ah,Léo! (Guilherme) Só poderia sair de vc mesmo, meu amor, um comentário de tamanha sabedoria e sensatez. Eu tenho o privilégio de ter vc na minha vida me instruindo e me tornando uma cidadã mais politizada. E fico mais feliz ainda de ver que vc começa a colocar ao alcance de todos sua grande arte de pensar, escrever e agir como cidadão crítico e honesto que é.
Continue expondo suas ideias.
Mil bjos.
Ladica